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Prazos de pagamentos atrofiam economia

Saiu recentemente um estudo, coordenado por Augusto Mateus, que analisa os impactos na economia portuguesa dos atrasos de pagamentos entre clientes e fornecedores.
O estudo, para além de fazer o enquadramento histórico, medita sobre o actual panorama da economia nacional, quantificando as perdas decorrentes de uma cultura de pagar tarde e a más horas e aponta caminhos de mudança organizacional com base em boas práticas de gestão do risco.

Em Portugal, estima-se que 44% do total dos pagamentos são efectuados com atraso, reduzindo para os 40% entre as Grandes Empresas e aumentando para 47% no caso das PME’s, situando-nos 20% acima da média europeia e sendo apenas ultrapassado pela Itália.
No que respeita ao indicador de contas a receber temos vindo a registar um agravamento sucessivo. Embora nesta dimensão não tenha havido uma homogeneização entre os países analisados, comparamos com os países do Sul da Europa, grupo que contrasta com a evolução positiva dos países do Norte e Centro.

Este quadro mostra claramente que o efeito da falta de liquidez no mercado nacional vai atrofiando cada vez mais as pequenas empresas. Os sectores mais afectados são a agricultura e pescas, onde existe um tecido empresarial retalhado, e uma forte concorrência externa. Verifica-se também um agravamento no sector da construção por força da forte retracção do mercado pelo lado da procura.
Estes factos estão a tornar-nos “campeões” nos créditos incobráveis, cuja tendência este ano se tem agravado assustadoramente, fortemente alavancado pelo crescimento das insolvências e da dilatação dos prazos de pagamento. De facto, tudo isto se tem tornado num ciclo vicioso pois as empresas que sofrem da falta de liquidez atrasam cada vez mais os pagamentos a fornecedores, contagiando a economia.

Dados analisados, numa amostra de 153 empresas, mostram que cerca de 24% sentem um forte ou muito forte estrangulamento operacional, 34% avaliam aumento nos custos financeiros por força do recurso a financiamentos bancários e 29% admitem uma forte ou muito forte dificuldade no pagamento aos seus fornecedores.
Cerca de 46% das empresas apontam como principal razão para o atraso de pagamento a “falta de liquidez por deficiência na rentabilidade da empresa”. Isto é, quase metade das empresas atrasa pagamentos assumindo que, o negócio poderá não libertar fundos suficientes para fazer face ao normal ciclo económico dado que parte do capital é afectado para apoio à tesouraria.

Ora, para além das graves implicações de relacionamento comercial (quebra de confiança) entre clientes, fornecedores, Estado e Banca, o efeito mediato mais grave prende-se com a possibilidade da empresa colocar em risco a sua própria sobrevivência. Em termos macroeconómico existe um efeito sistémico extremamente negativos na medida em que provocam uma redução da actividade empresarial, atrofiam a criatividade e o empreendedorismo. Actualmente, em Portugal este impacto é maior face à dificuldade na obtenção de crédito e num contexto de elevadas taxas de juro o que poderá no médio prazo comprometer o crescimento do PIB e aumentar a empregabilidade criando mais desemprego.

Outra grande dificuldade no nosso contexto de pequenas médias empresas, é o facto das relações comercias assentarem num estatuto cultural subjectivo em que existe um receio de perder o cliente impedindo muitas das vezes os credores de fazer valer os seus direitos em nada ajudados com um quadro jurídico que funciona mal e protege os devedores.

No sentido de disciplinar esta matéria na EU, A Comissão publicou em 16/02/2011 uma directiva (2011/7/CE) que deverá transposta para Portugal até 2013 e onde se prevê (como orientação) o prazo de 60 dias como limite para as empresas pagarem. Esta directiva tem assim uma intenção disciplinadora e implica uma mudança organizacional na nossa cultura empresarial e institucional já que abrange as relações entre privados e entre públicos e privados. São três os objectivos propostos na Directiva:

1)      Estipula a introdução de disposições específicas em relação a prazos de pagamento para entidades públicas e privadas;

2)       Imputa todos os custos de cobrança da dívida ao devedor (como sejam juros de mora, despesas suportadas no recurso aos serviços de um advogado ou agência de cobrança de dívidas e outros custos administrativos)

3)      Combate o abuso de poder dominante dos clientes introduzindo disposições específicas em relação à indemnização dos credores pelos prejuízos sofridos e determinando, como cláusula contratual manifestamente abusiva, a exclusão do direito a indemnização pelos custos suportados com a cobrança da dívida.
Caso as empresas e Estado cumpram os 60 dias, a economia poderá gerar:

a)      Mais de 120.000 postos de trabalho;

b)      VAB impulsionado em 4,8 mil milhões de euros (3,1% do PIB);

c)       Ganhos na produção nacional de 22 mil milhões de euros.

Com o Estado em crise, com as empresas a alargarem os prazos de pagamento e com os bancos a reduzir a sua exposição na economia, dá para pensar se a afectação dos recursos do Fundo de Estabilização que se pretende fazer será o melhor caminho para uma Europa que teima em não decidir.
Pena é que a Directiva seja apenas uma orientação e não uma condição. Talvez assim lá fossemos.

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