Nos últimos tempos os nossos políticos
têm sido profícuos na divulgação de bons exemplos empresariais. Comitivas e
meios de comunicação social são excitados para fazer chegar a mensagem aos
portugueses de que somos melhor do que pensamos.
No país de Europa onde existe a
maior desigualdade de rendimentos e um índice de pobreza que nos últimos 3 anos
subiu 85% duvido que a mensagem tenha o efeito analgésico de fazer esquecer a
mediocridade e incompetência daqueles que promovem a iniciativa.
Mas hoje fiquei rendido ao
exemplo do Zé Carlos que, numa virtude de humildade, colocou em causa toda a
evolução minimalista da nossa culturalidade e me fez acreditar que ainda existem
exemplos significativos cá dentro. O Zé Carlos é o dono da “Casa dePasto Canastra Azul”.
Situada no Porto, esta casa de
pasto tem uma característica invulgar: o cliente come o que lhe apetece e paga
o que acha justo por aquilo que comeu. E esta é a primeira lição de boa
cidadania que levamos. Num pais onde só 10% confia nos outros, este homem
confia em qualquer um outro que entre e se sente para comer. Segundo a sua
versão, as pessoas sabem o que custa a vida e quando deixam o dinheiro em cima
da mesa, normalmente, é o preço que ele também acha justo.
O processo não tem atraído “chicos-espertos”
– diz ele. O que põe em causa o estereotipo de chico-espertismo de que somos
apelidados.
A primeira pergunta que faz ao
cliente quando se senta é: “tem muita ou pouca fome?”. E o repasto vai sendo
servido e variando de acordo com a pergunta.
O conceito foi formado com
algumas ideias que o Zé Carlos viu nas suas viagens pela Europa e na cozinha
aplica algumas competências que adquiriu na experiência de montanhismo. Para
além das entradas (pão, queijo e azeitonas), aqui só se servem refeições à base
de conservas, acompanhadas com bata e legumes cozidos ao vapor. Esta é outra
das lições, a capacidade de aprender com os outros e aliar a isso a simplicidade
da criatividade.
- “E ganha muito dinheiro com o
negócio?” – perguntou o entrevistador.
- “O dinheiro não é importante, ganho algum
dinheiro mas não dá para abrir nenhuma conta em off-shore”.
Extraordinário, não acham? O
dinheiro não é importante porque ele sente-se realizado e identificado com o
seu trabalho.
E remata: - “O que me dá mais gozo é o
facto de muitos clientes cá voltarem e as mensagens que recebo de gratidão”.
E isto é, de facto, o centro daquilo que nos deveria mover diariamente.
Não sei se o Cavaco Silva já
levou a sua comitiva ao local para servir de exemplo ao
País, mas se não o fez, digam-lhe que não apareça ao sábados ou domingos. É
que o Zé Carlos fecha para descansar e estar com os amigos.
Extraordinário este
pequeno/grande exemplo.
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