Eram 09h30 de
sexta-feira quando o Luís enviou o primeiro e-mail do dia ao seu superior: - “o
cliente necessita de saber se podemos reunir para a semana”.
- “Falaremos nisso ainda hoje
quando passar por ai”.
Nada de estranho, era normal o
superior do Luís passar no escritório. Embora por norma, a visita fosse sempre
do seu conhecimento prévio, ainda assim, o Luís tomou-o como uma normalidade.
Por volta das 17h30 quando o
superior chegou ao gabinete, o momento trouxe alguma preocupação. Ele gostava
de conversar. E logo nesse dia que o Luís tinha de ir buscar a filha à escola
às 18h15.
Depois de ¼ hora de conversa
entre eles os três (a Mafalda ainda se encontrava):
– “Luís vamos nós conversar um
bocadinho? Feche a porta”.
Porta fechada.
- “Não foi de propósito mas, hoje
é o último dia para comunicar as avaliações e tu és a última pessoa com quem
vou falar e mesmo no final do dia” - disse. Risos.
- “Os últimos são os primeiros” –
disse o Luís num tom irónico. Mais risos.
- “Olha, a tua avaliação é igual
à do ano passado. Não há muito mais a dizer. Nós achámos que deveríamos mantê-la”.
Em 30 segundos a avaliação anual estava
comunicada. Provavelmente, outro tanto foi o que tinha sido gasto para a fazer
(pensou o Luís).
Com 25 anos de trabalho já estava
habituado aos disparates circunstanciais que o momento lhe proporcionou nos
últimos anos. O processo de avaliação era matéria que já não lhe merecia
confiança.
Olhou para o relógio. Tinha que ir buscar a filha.
O cliente não soube nesse dia se
era possível a reunião.
No caminho pensou mais a sério
sobre o assunto e sentiu novamente o descrédito num processo que deveria ser
partilhado e discutido em todos os seus itens com vista à melhoria do
desempenho. Para bem do colaborador e da própria empresa.
Nos últimos anos assistiu-se a
uma perseguição no cumprimento de objectivos de curto prazo a qualquer preço.
Não interessa os meios, o que importa são os resultados e são estes, apenas
estes, que justificam os lugares. Até porque o mercado tudo engole. Até porque
era isso que interessava nas avaliações.
Mas a nova realidade deveria conduzir
a uma nova mentalidade (principalmente daqueles que têm a responsabilidade na
condução de equipas). E para isso era necessário que percebessem que o que
funcionou já não funciona agora. Mas nada se aprendeu.
O Luís já há muito que sentia que
o telefonema a apresentar o serviço ou a pedir ao cliente para vir ao escritório
já não servia. É necessário uma abordagem mais planeada e dirigida às suas
necessidades, ao seu perfil, àquilo que ele valoriza. Hoje factores como
o tipo de relações sociais, a dimensão do agregado familiar ou os valores partilhados, tornaram-se
críticos para uma boa performance comercial.
Mas na empresa o que interessa é
o que se vende no final do dia. O problema do Luis é que ele não é um
corredor de 100 metros. Ao longo da sua experiência profissional tinha sido
formado para aguentar a relação comercial o mais tempo possível. É muito importante
que o cliente, perante uma necessidade, se lembre dele. É sinal que existe uma
relação de confiança e isso permite uma venda mais fácil com vantagens para
todos.
Hoje avalia-se os colaboradores
por factores parametrizados e que apenas justificam o lugar de quem chefia. Não
interessa os valores motivacionais individuais. Mas também para que importa
isso? Se não vende, encosta-se. Chama-se outro.
O desajustado é o Luís. Pouco
importa se os clientes se sentem como parceiros num negócio onde todos podem
ganhar. O que importa é que se chegue ao final do dia com vendas.
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